"Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada.
-Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser..."
Álvaro de Campos
"Há muitos tipos de corações.
Há corações pequenos e tímidos, há corações grandes e abertos, há corações onde é preciso meter requerimentos de papel azul e selo de garantia para abrirem as portas e outros cheios de janelas, frescos e arejados.
Há corações com trancas, segredos e sistema de alarme que são como cofres de bancos. Corações sombrios e desconfiados, com fechaduras secretas e portas falsas.
Corações que parecem simples, mas quando se entra lá dentro, espera-nos o mais perverso dos labirintos.
Há corações que são como casas antigas, cheios de mistérios e fantasmas, com jardins secretos e sótãos poeirentos, carregados de memórias e recordações e há corações simples e fáceis de conhecer, descontraídos e leves...
Há corações que são como borboletas e voam de um lado para o outro sem parar, numa pressa ansiosa de viver tudo antes que a vida se acabe.
Há corações duros como aço, onde nada risca e faz mossa e corações de plasticina que se moldam às formas dos corações que amam. Há corações de papel, bonitos e frágeis que se amachucam facilmente e desbotam à primeira lágrima, há corações de vidro que quando se estilhaçam nunca mais se recompõem e corações de porcelana que depois de se partirem ainda sabem colar os destroços e começar de novo.
Há corações de uma só porta que são como grandes casas de família e outros de duas portas, uma para a sociedade e outra para a intimidade.
Mas há ainda uma ou outra espécie de corações, os corações hospedeiros que sabem receber e fazem sentir os outros corações como se estivessem em casa, que dão e aceitam amor sem se fixarem, que tratam cada passageiro como se fosse o último, enquanto procuram o coração gémeo, sempre na esperança, secreta e nunca perdida de um dia deixarem de viajar e sossegarem para a vida."
Margarida Rebelo Pinto